Recaatingamento

Destaques

24/11/2022

“Temos que apostar na Caatinga porque é o nosso jeito de viver, é o nosso patrimônio”, afirma agricultor

 

 

 

 

 

 

 

 

O encontro reuniu agricultores, agricultoras, pesquisadores/as, estudantes e jovens do Território Sertão do São Francisco – TSSF para apresentar os estudos e monitoramentos das áreas de Recaatingamento e discutir o plano de manejo, entre outras ações ligadas ao Recaatingamento e ao Projeto Bem Diverso.

Por muitos anos, foi criado no imaginário das pessoas a ideia de que a Caatinga era um bioma pobre e de terra seca. Contrariando esse estigma de miséria, o pesquisador da Embrapa, Saulo Aidar , defende a resistência das espécies de plantas forrageiras e frutíferas presentes na Caatinga. “A velocidade de resposta diante da adversidade, a gente está falando principalmente da capacidade de resistência e de recuperação das plantas em situação de seca”, evidencia o pesquisador. Para ele, a oportunidade de ter essas plantas deve ser valorizada ao tempo em que alerta sobre a necessidade de cuidar do solo.

Em consonância com o pesquisar, o agricultor e defensor da Caatinga Alcides Peixinho, da comunidade de Fundo de Pasto de Ouricuri, em Uauá, expõe a importância da Caatinga para a proteção do solo e na garantia da sustentabilidade dos povos do Semiárido, especialmente as comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto. “Temos que apostar na Caatinga porque é o nosso jeito de viver, é o nosso patrimônio”, argumenta o agricultor. Para Peixinho a ação do Recaatingamento é o caminho para garantir a Caatinga em pé através do trabalho de conscientização e educação ambiental das pessoas. O mapeamento participativo realizado pela Embrapa na comunidade de Ouricuri, com apoio do Projeto Bem Diverso, mostra que “o modo de vida destas comunidades nos seus 200 anos de existência foi capaz de preservar 81% da Caatinga de Pé”, pontuou a pesquisadora Paola Cortez.

As comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto na luta pelos seus territórios desenvolvem um importante papel de guardiãs da fauna e flora da Caatinga, prática que foi intensificada com implementação do Recaatingamento desde o ano de 2009 nos municípios do TSSF. Desde o ano passado, o Projeto Bem Diverso vem realizando pesquisas e estudos para avaliar as ações do Recaatingamento. Em parceria com a Embrapa está sendo realizado estudos relacionados com solo, flora, fauna e suporte de manejo da Caatinga.

Os resultados dessas pesquisas foram apresentados no seminário pelos/as pesquisadores/as. Para Luís Almeida, colaborador do Irpaa e responsável técnico pelo Projeto Bem Diverso, “os dados que a gente apresentou mostra que o Recaatingamento é capaz de dar resposta a uma questão tão fundamental que é hoje a conservação e recuperação de Caatinga frente ao processo de mudança climática”. Em relação às mudanças climáticas, a pesquisadora Barbara França, aponta que a Caatinga é mais vulnerável a essa mudanças e neste caso o desmatamento é um forte causador do efeito estufa. “O que se pode fazer: diminuir o desmatamento e aumentar o reflorestamento” , afirma França. Essa fala da pesquisadora só reafirma a defesa de Luís sobre as contribuições do Recaatingamento: “com as mudanças climáticas, o Recaatingamento vem para dar uma resposta a isso, otimizando o uso das comunidades, o uso da terra, dos recursos naturais com responsabilidade e preservação” , reafirma Almeida.

As/os representantes das comunidades recaatingueiras também socializaram a experiência e os resultados do Recaatingamento, momentos que todos destacaram que é perceptível a mudança nas áreas isoladas do Recaatingamento, como surgimento de novas plantas, a presença de animais, a exemplo da comunidade de Bom sucesso, em Sobradinho. Seu José Neto Costa, relata que já é possível notar a diferença entre a área do Recaatingamento e a área de fora, além disso, os estudos e pesquisas demonstram que houve um aumento na capacidade de suporte da Caatinga.

Para a agricultora Marli Alves Passos, da comunidade Pedrinha, em Remanso, o Recaatingamento tem transformado o olhar e pensamento da comunidade e essa mudança não está ligada somente a preservação e conservação da Caatinga, para ela tem ultrapassado esse horizonte. “Nossos filhos estão estudando técnico agrícola por causa do Recaatingamento … foi através do Recaatingamento que a gente tem hoje jovens inseridos na projeto, na comunidade o Recaatingamento trouxe muita história”, afirma a agricultora. O agricultor Bartolomeu Rocha, da comunidade de Melancia, interior de Casa Nova, também pontua que um dos frutos do Recaatingamento foi o grupo de jovens e a maior inserção da juventude na vida da comunidade.

Todos esses depoimentos mostram que houve um avanço na compreensão da riqueza da Caatinga e que o envolvimento das famílias é o que tem impulsionado de fato os resultados positivos do projeto. Muito se evoluiu no trabalho de conservação e defesa da Caatinga em Pé, mas ainda existem muitos desafios a serem vencidos. Um deles é no tocante ao suporte da Caatinga e a prática do superpastoreio, preocupação que já vem sendo discutida nas comunidades.

Rede Jovens da Caatinga

O Bem Diverso, que é uma parceria entre o Irpaa, PNUD – Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento e a Embrapa – Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, também atuou na formação em comunicação para jovens oriundos das comunidades Tradicionais de Fundo de Pasto. Essa juventude participou de seis módulos de comunicação, onde foram trabalhadas as linguagens de impresso, rádio, vídeo e rede sociais. Como resultado de todo esse trabalho, as/os jovens formaram a Rede de Comunicadores e Comunicadoras Populares Jovens da Caatinga e hoje mantém a página @JovensdaCaatinga no Facebook.

 

Toda essa experiência foi apresentada pelos jovens no encontro. A pesquisadora Barbara Dantas, da Embrapa, destaca que “a confiança com que esse jovens falaram, que apresentaram o trabalho deles (…) isso também influencia no processo do Recaatingamento, no processo de conservação (…) a confiança com que eles falam o que pensam é o que faz a gente acreditar nesse processo”.

A jovem Antônia Vitória Oliveira Rodrigues, da comunidade Campo Alegre, em Sobradinho, integrante da Rede, revela que o que despertou seu interesse pelo projeto foi poder trabalhar na divulgação do modo de vida das comunidades: “isso é importante porque mostra o quanto as pessoas da roça é importante”, diz ela. Essa riqueza presente nas comunidade pode ser mostrada a partir das produções da juventude e Antônia Vitória acredita que a fotografia, por exemplo, pode ser uma ferramenta importante na construção dessa valorização.

Texto: Comunicação Irpaa
Fotos: Antônia Vitória Oliveira (Rede Jovens da Caatinga)

 

21/11/2022

A experiência de comunidades tradicionais e o relacionamento intrínseco com a Caatinga

Os sertanejos desenvolveram técnicas de convivência com o semiárido ao longo dos anos para se adaptar a falta de chuvas, característica marcante do bioma

Os espinhos, a seca e falta d`água que racha o solo são algumas características de um estereótipo hostil criado em torno da Caatinga. Não à toa seu nome tem o significado de mata branca em tupi: ka’a [mata] + tinga [branca], em alusão ao período de seca em que a vegetação perde as folhas, ficando esbranquiçada e dando destaque à cobertura espinhosa da plantas. O bioma exclusivamente brasileiro, pelo contrário, reúne uma rica e única biodiversidade, o que significa que boa parte das espécies encontradas no bioma, só existem lá.

Apesar dos poucos estudos acadêmicos em relação ao bioma, estima-se que numa área de 850 mil km² de Caatinga há cerca de 932 espécies de plantas, das quais 380 são endêmicas, ou seja, só se desenvolvem na região; 591 espécies de pássaros; 241 espécies de peixes; e mais de 400 espécies de animais entre répteis, anfíbios e mamíferos. O bioma ocupa mais de 10% das terras do país e grande parte do Nordeste na região do Semiárido.

Isto mostra a grande dualidade existente entre o que a Caatinga realmente é e o estigma que se criou historicamente. “O semiárido não é pobre, ele é empobrecido. Foi criada uma visão a partir da estruturada sócio, política, econômica que vem desde a colonização, inclusive com a associação de que a seca era considerada um castigo de Deus”, declarou o representante do Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), Luís Piritiba, lembrando que a seca deixou de ser vinculada a questões religiosas a partir dos anos de 1990.

Ele defende que as pessoas devem entender que existem diversas Caatingas dentro do bioma, que se destingem uma das outas pela quantidade de chuva, relevo, tipos de solo e, principalmente, pela relação do homem com a natureza. A irregularidade da chuva, no entanto, é uma característica comum, o que faz com que a centralidade da água no semiárido ganhe uma dimensão ainda maior.

Seus povos, popularmente conhecidos como sertanejos, desenvolveram, ao longo dos anos, técnicas de convivência com o semiárido. A partir do manejo tradicional da Caatinga destacou-se o entendimento do uso sustentável da biodiversidade de forma a armazenar água, além de criar um relacionamento intrínseco com fauna e flora que ajuda no incremento alimentar, sobretudo nos períodos mais secos do ano.

O manejo tradicional e o desenvolvimento sustentável

Contrariando o modelo do sistema produtivo baseado na concentração de terras com divisão bem delimitada dos espaços produtivos (principalmente voltados à monocultura), no semiárido o tradicional mesmo é o uso comunitário dos recursos. O sistema é conhecido como Fundo de Pasto e nele não há cercas entre as propriedades e os animais são criado livremente, o que facilita o acesso à água e comida, sem a necessidade da derrubada das espécies nativas para a criação de pastagens.

Um estudo realizado pela Embrapa Semiárido, com apoio do Projeto Bem Diverso, em 2018, na comunidade tradicional Fundo de Pasto Ouricuri, em Uauá (BA), mostra que as 55 famílias que ocupam tradicionalmente há 150 anos a região mantêm mais de 80% de seu território coberto pela Caatinga. Os outros 20% de área aberta são utilizados para as moradias, acessos, aguadas e roçados, sendo que nestes, são mantidas uma grande diversidade de espécies, com mais 100 diferentes culturas de uso alimentar, forrageiro, medicinal e energética. O espaço estudado ainda possui uma ampla diversidade nas variedades tradicionais das culturas alimentares, como 11 variedades de mandioca/macaxeira, exemplificou a pesquisadora da Embrapa Semiárido Paola Bianchini, responsável pela pesquisa e ponto focal do Bem Diverso no Território do Sertão do São Francisco.

Já a criação animal é focada em ovinos e caprinos, com uma conserva de cerca de dez raças localmente adaptadas, chamadas de “pé duro”. Essas raças são mais resistentes e totalmente adaptadas ao manejo tradicional e à Caatinga”, complementou Bianchini. A comunidade também reconhece em seu território a presença de 52 espécies da fauna silvestre, segundo o estudo.

O extrativismo vegetal representa uma fonte de renda importante para a comunidade. O umbuzeiro é uma espécie endêmica da Caatinga, principal produto da cadeia da sociobiodiversidade do bioma. Grande parte da produção de umbu é realizada por comunidades Fundo de Pasto na Bahia. Na comunidade estudada, um extrativista coleta, em média, 50 kg de umbu em cinco horas de trabalho por dia. Ao longo da safra de umbu, que ocorre durante três meses, os extrativistas se dedicam a esta atividade durante 50 dias, coletando ao final do período 2,5 toneladas de fruto, o que gera uma renda de 2,5 salários mínimos.

Esta atividade, além da garantia da renda, também garante a preservação da espécie. Observou-se que a densidade de umbuzeiro nas áreas de Fundo de Pasto é de sete plantas/ha, somando aproximadamente 17.500 plantas, nos 2,5 mil hectares do território da comunidade. Mais recentemente, a comunidade tem desenvolvido, de forma independente, o cultivo de espécies da Caatinga como o mandacaru (Cereus jamacaru), fortalecendo suas estratégias de uso sustentável.

“Isto significa que a comunidade, além de todos os benefícios sociais e econômicos gerados, também está conservando no local, uma grande diversidade de umbuzeiros, importante para garantir variabilidade genética e a evolução da espécie”, analisa Bianchini.

A pesquisadora ainda explica que a comunidade também contribui para a regeneração da espécie como o enriquecimento da Caatinga, que consiste no plantio de mudas de umbuzeiro em faixas ou clareiras. Conhecido na região por Recaatingamento, a prática implica no plantio de espécies nativas em áreas cercadas e a fruticultura de sequeiro, uma agroflorestal, na qual as espécies chave são o umbuzeiro e o maracujá.

O Projeto Bem Diverso contribui para o desenvolvimento sustentável da Caatinga com atuação para a conscientização do seu uso sustentável e o empoderamento das comunidades locais dos Territórios da Cidadania do Sertão do São Francisco e Sobral, com apoio da Embrapa Semiárido (PE) e Caprinos e Ovinos (CE).

Além das parcerias com as associações de produtores locais Coopercuc e Central da Caatinga, o Projeto ainda promove o desenvolvimento sustentável da região com ações conjuntas de formação e capacitação com a Escola Família Agrícola do Sertão (Efase), o Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), a Fundação Araripe e a Assessoria e Gestão em Estudos da Natureza, Desenvolvimento Humano e Agroecologia (Agendha).

Lara Aliano, Agência MOC
Com informações da pesquisadora Paola Bianchini, da Embrapa Semiárido

Foto: Comunicacao Irpaa e Bem Diverso

 

12/11/2022

Experiência do Recaatingamento desenvolvida pelo Irpaa recebe premiação em Brasília

No ano de 2009, sete comunidades de Fundo de Pasto nos municípios de Canudos, Casa Nova, Curaçá, Sobradinho, Sento Sé, Uauá e Juazeiro, em parceria com o Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada – Irpaa deram início a prática do Recaatingamento. Nos anos seguintes, o projeto chegou a outras comunidades nos municípios de Pilão Arcado, Remanso e Campo Alegre de Lourdes.

Nos 10 primeiros anos de atuação, o Recaatingamento foi um dos vencedores do Prêmio BNDES de Boas Práticas para Sistemas Agrícolas Tradicionais. A cerimônia de entrega aconteceu no dia 18/06/2018, na Sede da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), em Brasília. A premiação é uma iniciativa do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), a Embrapa e a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO/ONU).

Visibilizar, fortalecer e apoiar as práticas de salvaguarda e conservação dos Sistemas Agrícolas Tradicionais – SAT desenvolvida a partir da sustentabilidade das comunidades tradicionais, dos seus saberes e suas tradições era alguns dos objetivos do prêmio que concedeu ao Recaatingamento o quinto lugar na premiação. O Irpaa recebeu o valor R$ 70 mil referente ao prêmio, montante que foi aplicado em investimento para as 11 áreas de Recaatingamento hoje existentes no Território Sertão São Francisco.

Representantes do Irpaa e das comunidades premiadas estiveram na cerimônia da premiação. De acordo com a representante da comunidade de Fundo de Pasto, Joana Maria de Jesus, localizada em Lagoa do Sal, em Campo Alegre de Lourdes, esse prêmio contribuiu para “fortalecer nosso trabalho na comunidade e a valorizar nossa área e nossa Caatinga que está de pé”. A agricultora ainda complementa que o Recaatingamento coopera no processo de união da comunidade.

O Irpaa comunga dessa avaliação e destaca que o mérito da premiação é das comunidades envolvidas com o projeto. “Ganhando esse prêmio, as comunidades do Recaatingamento passam a se fortalecer e acreditar mais no trabalho, que é de grande importância para as comunidades tradicionais de Fundo de Pasto. A gente acredita que vem a fortalecer a união das pessoas”, avalia o colaborador do Irpaa Agostinho Pereira, que também esteve presente na solenidade de entrega do prêmio.

Prêmio BNDES de Boas Práticas para Sistemas Agrícolas Tradicionais

Reconhecido nacionalmente, o Recaatingamento, é umas das 15 iniciativas que foram premiadas. As cinco primeiras colocadas foram: no primeiro lugar foi a Associação de Mulheres Trabalhadoras Rurais (AMTR), do Lago do Junco (MA); em segundo lugar, ficou a Associação dos Produtores Rurais de Vereda, de Matias Cardoso (MG); em terceiro, a Associação dos Remanescentes de Quilombo de São Pedro, de Eldorado (SP), na quarta colocação, a Associação Comunitária Rural de Imbituba, de Imbituba (SC).

Após o evento de premiação, ocorreu seminário com dois painéis tendo como tema: Reconhecimento de Sistemas Agrícolas Tradicionais e Experiências de Sistemas Agrícolas Tradicionais no Brasil e as instalações pedagógicas das experiências vencedoras, espaço onde as representações das entidades e comunidades apresentem suas vivências que retrate o SAT desenvolvido em sua comunidade.

Recaatingamento

O Recaatingamento é uma metodologia de recuperação de áreas degradadas no Semiárido, que nasceu da observação e inquietação das comunidades rurais, principalmente das mulheres. O projeto busca contribuir para inverter a devastação e processos iniciais de desertificação da Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, a partir do uso sustentável de seus bens naturais, da conservação e recomposição da Caatinga, educação ambiental contextualização e do beneficiamento dos frutos da Caatinga, tendo as agricultoras e agricultores como protagonistas pela transformação socioambientais de suas comunidades.

Diante nessa nova concepção, as comunidades de Fundo de Pasto incorporam no seu jeito tradicional de viver a defesa da Caatinga em Pé, como forma de garantir sua sustentabilidade e o equilíbrio entre o ser humano e a natureza.

Texto: Comunicação Irpaa

7/11/2022

‘Abelhas voltaram’: Premiado, projeto ‘recaatinga’ parte do sertão da Bahia

Uma das maiores iniciativas de restauração da Caatinga segue em curso na Bahia para alegria de dezenas de comunidades que estão vendo a mata renascer no sertão. Trata-se do projeto “Recaatingamento”, conduzido pelo IRPAA (Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada), organização de Juazeiro.

Tudo começou em 2009 quando mulheres perceberam que umbuzeiros novos não estavam nascendo mais e que, se o problema continuasse, a árvore logo estaria extinta na região. Capaz de armazenar até 1 mil litros de água nas raízes tuberosas, o umbuzeiro é apreciado pelas extrativistas que, todo ano, aproveitam a safra para fazer doces, geleias, compotas e até cervejas com o fruto agridoce.

Hoje, 35 comunidades tradicionais de 14 municípios estão sendo beneficiadas pela iniciativa conservacionista. Mais do que replantar espécies nativas, o projeto busca resgatar o valor sociocultural da Caatinga com a participação das comunidades.

As famílias reúnem-se em rodas de educação ambiental, dialogam, decidem em conjunto e botam a mão na massa.

“Este não é um projeto do IRPAA. É um projeto da sociedade e a gente trabalha a valorização da identidade para que as pessoas reconheçam-se como caatingueiras. Queremos mostrar também que a Caatinga em pé vale muito mais”, explica Luís Almeida, Coordenador Técnico da organização, lembrando que 50% do bioma encontra-se degradado.

Recaatingar, então, traz vários benefícios: “Evita a erosão, atenua a desertificação, restabelece a biodiversidade, restitui o microclima local, sequestra carbono da atmosfera, mantém o ciclo da água e garante alimentos, fibras e frutas, gerando renda?”, elenca Almeida.

Nas áreas de manejo, que somam mais de 30 mil hectares, são aplicadas técnicas simples para restauro do que foi depredado e conservação do que resta. Muitas vezes, as tecnologias baseiam-se no conhecimento tradicional que a própria comunidade possui. O projeto já ganhou um prêmio da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) e outro do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).

No povoado rural de Lagoa Branca, em Campo Formoso, os moradores trabalham em mutirão para recuperar áreas degradadas por desertificação severa, onde voçorocas chegam a quatro metros de profundidade.

O estrago foi causado por décadas de superpastoreio, desmatamento e práticas agrícolas predatórias, como a superexploração das águas do rio Salitre, que passa ao lado. O quintal de Joselina Pimentel, presidente da associação quilombola local, está cheio de voçorocas ameaçando aprofundar-se em direção à casa.

No mutirão semanal, por volta de 15 moradores entre homens, mulheres e jovens reúnem-se para preencher os sulcos e ravinas com pneus usados, troncos, pedras e até folhas de sisal, criando “barramentos”.

A ideia é impedir que as chuvas de verão não aprofundem a erosão ainda mais, arrastando toneladas de terra para o leito do rio. “Quem sabe a gente possa ter o tatu-bola, o jacu e a raposa de volta, né?”, anseia Joselina.

Na Lagoa Branca, as mulheres ficam com o serviço mais leve, como demarcar as áreas que serão cercadas. Os homens ficam com a tarefa mais pesada, como fincar os mourões da cerca na terra batendo em marretas.

O objetivo é impedir que cabras e ovelhas entrem na área a ser restaurada e comam os brotos que podem nascer das “muvucas”, bolotas de esterco recheadas de espécies nativas, algumas endêmicas, que serão espalhadas pelo local).

Frágil mas com alta capacidade de regeneração, a Caatinga não tardou a recompensar a comunidade de fundo de pasto Melancia, em Casa Nova, um das primeiras contempladas pelo Recaatingamento.

Lá, também acontecem mutirões para coleta de sementes, produção de mudas nativas, trabalho no viveiro, entre outros serviços. O morador Thiago da Rocha, conta que o tatu e o jacu esperados por Joselina já reapareceram na Melancia.

“Hoje, temos umbuzeiros, umburanas, muitas aroeiras e até abelhas nativas nos ocos das árvores em um território grande, de 65 hectares”, acrescenta. Se tudo correr bem, ele espera que outros velhos moradores continuem retornando àquele pedaço revivido do sertão.

Texto publicado originalmente no site UOL

Lilian Caramel, colaboração para Ecoa, em Campo Formoso (BA)

Foto Lilian Caramel

10/10/2022

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